9 Jun 2022, 0:00
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O Brexit, a pandemia e a crise económica deixaram a comunidade portuguesa no limbo entre ficar no Reino Unido e regressar a Portugal, dizem dirigentes associativos e empresários na véspera da visita do Presidente da República a Londres.
Marcelo Rebelo de Sousa estará na capital britânica de 10 a 12 de junho por ocasião das celebrações do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, numa altura em que muitos questionam a permanência no país de acolhimento.
“Nunca me senti imigrante, achei que era tratado como igual. Mas depois do Brexit já me sinto estrangeiro”, confessou à agência Lusa o empresário e Conselheiro das Comunidades Madeirenses José Silva.
No Reino Unido há 40 anos, subiu a pulso e construiu um grupo económico com restaurantes e a importação de produtos alimentares portugueses.
Durante este tempo, viu o tipo de emigração portuguesa mudar, de pessoas menos qualificadas e com poucos conhecimentos da língua inglesa que se ficavam pelas limpezas, construção civil e restauração, para profissionais como médicos, engenheiros e arquitetos.
Depois do referendo de 2016, quando os britânicos votaram a saída da União Europeia (UE), o ambiente mudou.
“Não me tratam de maneira diferente, dizem ‘tu és um bom estrangeiro’. Mas no fim do dia somos todos imigrantes”, lamentou, desiludido.
Em Cardiff, o empresário Nuno Silva diz que milhares de portugueses deixaram nos últimos seis anos o País de Gales, país onde tinham chegado recrutados em grupo por agências para trabalhar em fábricas.
Alguns, explica, regressaram a Portugal porque não conseguiram o estatuto de residente, outros nem tentaram, desiludidos.
“Eu também quero ir daqui a uns dois anos. Desde o Brexit que nunca mais me senti à vontade”, revelou à Lusa.
Ana Silva, presidente da Associação Portuguesa de Watford, nos arredores de Londres, relata que muitas famílias continuam a regressar a Portugal, não só por causa do Brexit, mas também, mais recentemente, devido ao impacto da pandemia e da crise económica.
“Em 2016 ninguém pensava voltar a Portugal”, recordou, “mas depois as pessoas começaram a pensar”, acrescentando à lista de queixas as dificuldades de viajar causadas pela pandemia e o aumento de custo de vida.
Numa altura em que o aumento da inflação já está a ter impacto nos orçamentos familiares, a solução para reduzir as despesas tem sido a separação de famílias.
“Algumas esposas estão a voltar a Portugal com os filhos para ver se se adaptam, e, se gostarem, ficam. Os maridos, ou ficam cá e passam a ir lá mais de férias, ou vão de vez”, revela a organizadora de eventos.
Segundo José Manuel Sousa, dirigente do Grupo Desportivo Cultural, muitos emigrantes optam por ficar porque não querem deixar para trás filhos ou netos, a casa e uma vida construída ao longo de décadas.
Este cozinheiro de profissão vê algumas semelhanças entre a época em que chegou, em 1989, e o pós-Brexit: muita oferta de emprego, comprovada pela taxa de desemprego de 3,7%, o nível mais baixo desde 1974.