6 Sep 2022, 0:00
143
Por Gustavo Pires*
Nos último vinte anos o desporto que vai acontecendo em Portugal, que já esteve debaixo de três leis de bases que, a ver bem, acabaram esquecidas numa qualquer gaveta da burocracia do nacional desportismo, produziu atletas extraordinários nas mais diversas modalidades desportivas que, surgidos de geração espontânea, revelam a capacidade de superação dos portugueses. Estes êxitos que já aconteceram no vólei, no ciclismo, no atletismo, na vela, no remo, no ténis, no futebol entre outras modalidades se, por um lado, são o exemplo da capacidade competitiva dos atletas, por outro lado, revelam a incapacidade organizativa dos dirigentes desportivos portugueses. Se analisarmos o percurso de vida dos grandes atletas portugueses facilmente se verifica que, para além de uma certa ecologia social favorável, o êxito fica-se sobretudo a dever a eles próprios, às suas famílias, aos treinadores e dirigentes dos clubes e das federações. E quando se procura ver qual foi a competência do trabalho das estruturas intermédias, concluiu-se que serviram sobretudo para atrapalhar e iludir. O que se passou em Pequim, no Rio de Janeiro e em Tóquio exemplifica bem o fracasso das políticas públicas em matéria de desporto.
Ao cabo de vinte anos de políticas públicas desastradas está-se perante a evidência de que não é com um programa de preparação olímpica desintegrado do alto rendimento e até do sistema desportivo nacional, bem como de lideranças autocráticas ao estilo do velho educador da classe operária que, algum dia, o desporto nacional deixará de ocupar os últimos lugares entre os países da União Europeia. Não é criando estruturas intermédias caras, burocráticas e fora de um controlo público independente que o nível desportivo do país deixará de ocupar os últimos lugares da UE. Esta situação só será superada quando o desenvolvimento do desporto, que deve estar subordinado a um princípio ético-moral, passar novamente a ser equacionado a partir da base do sistema que é onde ele acontece, quer dizer, nas escolas e nos clubes sob a coordenação das federações desportivas e da superintendência política e controlo financeiro da tutela político-administrativa.
A visão gramsciana instituída no início do pressente século no desporto nacional está a destruí-lo e a destruir a dignidade nacional quando, à revelia da Carta Olímpica, as organizações desportivas, numa lógica iliberal, aceitam colocar-se ao serviço do aparelho ideológico do Estado a fim de catalisarem uma visão neomercantilista da economia política.
O desporto nacional deve, tão depressa quanto possível, ser novamente colocado ao serviço das pessoas, das famílias e do país tendo em atenção que, se as estruturas desportivas são um meio o serviço dos portugueses e não são o fim ao serviço de si mesmas, os dirigentes desportivos, em matéria de políticas públicas, são os executores das grandes linhas estratégicas, não são os decisores que, segundo o seu próprio arbítrio, decidem os destinos do desporto nacional.
*Professor jubilado da Faculdade de Motricidade Humana