4 Mar 2024, 0:00
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Ele tinha uma ligação muito forte ao Porto e às suas gentes", recordou Isabel Soares.
A revelação estava guardada para o fim. Entre muitas memórias, quase todas elas na primeira pessoa, e recordações políticas feitas durante a apresentação, na passada sexta-feira à noite, na Livraria Lello, da reedição de "Portugal Amordaçado", de Mário Soares, e a propósito das comemorações do centenário do seu nascimento, o presidente da Câmara do Porto anunciou que, na zona da Lapa, a zona verde e o jardim que ali estão a ser construídos vão perpetuar o nome do ex-Presidente da República.
Foi, de forma direta ao homenageado, "como se aqui estivesse", que Rui Moreira abordou o assunto. "São muitas as recordações, mas queria falar ao dr. Mário Soares: há dias, os seus filhos vieram falar connosco, a propósito das comemorações do centenário. Pensámos no que poderíamos fazer e decidimos que vamos dar o seu nome ao jardim que está a ser construído junto à Rua de Cervantes (na Lapa)", disse.
"Sempre que lá formos vamos lembrar-nos de si e, um dia destes, voltaremos a conversar", acrescentou.
Antes, o autarca lembrou o amigo de família. "Desta vez não o posso ir buscar ao 'Infante de Sagres' [hotel], mas imagino-o no Olimpo, provavelmente, porque estamos no Porto, a olhar por nós, juntamente com o Miguel Veiga e o Luís Roseira. Mande-lhes um abraço", afirmou, revelando que foi através do "Portugal Amordaçado" que conheceu Mário Soares.
"Percebemos, lá em casa, que as coisas iam mudar. O senhor esteve sempre connosco. Nos momentos mais difíceis, logo após o 25 de Abril e durante o Verão Quente, era sempre consigo que nós nos encontrávamos. Quando alguns se queriam apropriar da revolução e da liberdade, o senhor queria que ela fosse para todos", sublinhou Rui Moreira, falando também, "com o coração", de experiências pessoais que teve com Mário Soares, como, por exemplo, em 2013, aquando da candidatura independente à Câmara do Porto.
A noite foi feita de muitas recordações sobre Mário Soares. Do encontro de Álvaro Siza Vieira com o Ex-Presidente da República, em Milão – "não fui um ativo e eficaz lutador pela reconquista da liberdade, a não ser em espírito, o que na altura não bastava", confessou o arquiteto –, ao "herói político, a juntar há minha heroína, Maria de Jesus Barroso”, de Manuel Sobrinho Simões, passando pelas lembranças de Artur Santos Silva, que, em termos familiares e já há três gerações, tem contato com a família Soares.
"Homens como Mário Soares fazem muita falta ao país”, sublinhou o presidente do conselho de administração da Fundação La Caixa e que, em 1976, a convite do então líder do PS pertenceu ao sexto governo provisório, liderado por Pinheiro de Azevedo.
As memórias mais pessoais e até sobre toda a história do "Portugal Amordaçado" foram trazidas pelos filhos de Mário Soares: Isabel e João, que não deixaram de sublinhar a importância que o Porto teve sempre na vida política de seu pai.
"Ele tinha uma ligação muito forte ao Porto e às suas gentes, aos seus amigos e até à sua gastronomia. Lembro-me que ele dizia sempre: 'não há nada como ir ao Porto e ao 'Aleixo' comer os filetes [n.r.: Isabel Soares referia-se à Casa Aleixo, em Campanhã, encerrada em 2020]", afirmou a filha de Mário Soares, recordando também que a primeira visita que fez, após tomar posse como Presidente da República, em 1986, foi à Invicta, "onde depositou uma coroa de flores na estátua de D. Pedro IV, justamente como homenagem ao símbolo da liberdade”.
Isabel Soares sublinhou, entre algumas histórias sobre a elaboração do "Portugal Amordaçado": "este livro faz parte das nossas vidas. Foi o legado que ele nos deixou”, acrescentou.
Também João Soares não deixou de referir a importância do documento histórico que seu pai escreveu, em termos políticos. "Quando saiu de Portugal para o exílio, ele tinha dois grandes planos: escrever o livro e fundar o Partido Socialista", frisou, confessando que ele "nunca escreveu nada à máquina. Era tudo manuscrito. E este livro não teve direitos de autor".