6 Jun 2025, 8:42
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NOVOS TEMPOS
Por Sérgio Carvalho
Em Portugal, reacendeu-se o debate sobre o aborto a que, eufemisticamente, chamam de «interrupção voluntária da gravidez». O reacendimento deveu-se à passagem, nas televisões, de um vídeo publicitário, pago por um particular, intitulado «Obrigado Mãe» que defendia o direito à escolha e à vida, em detrimento do aborto.
Os mesmos do costume, vieram logo a terreiro inquinar o debate com as questões do feminismo e dos supostos direitos da mulher. Nos palcos do mediatismo pode defender-se o direito ao aborto, mas quem defende o direito à vida não pode expressar livremente as suas ideias e convicções.
Nós vivemos num estado de direito e a liberdade de expressão é um dos direitos consagrados. No artigo 37 da Constituição da República Portuguesa diz-se que: 1. Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações. 2. O exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura.
Todas as pessoas têm direito de expressar as suas ideias, livremente, sem serem perseguidas, ofendidas ou silenciadas. Tudo isto seria verdade se ambos os lados pudessem expressar, sem coação, aquilo em que acreditam.
O debate padece, logo à partida, de uma falácia. Quando se fala de aborto, estamos a falar de permitir pôr fim a uma vida humana. Bem sei que muitos dos defensores do aborto, não conseguem sequer concordar com o dado científico do início da vida humana. E, por infeliz coincidência, aqueles que dão a cara na defesa do aborto são, muitas vezes, os mesmos que lutam pelos direitos dos animais e contra a guerra ou genocídio. Não conseguem concordar que a vida humana tem início na fecundação e que evolui sem cortes ou metamorfoses, tendo sempre o mesmo código genético até à morte. Se concordassem teriam de assumir que são eliminadas, voluntariamente, milhões de vidas humanas.
Outra falácia que foi desmontada com a publicação do relatório da Entidade Reguladora da Saúde (ERS), de maio de 2025, foi que devido à legalização do aborto, a sua prática tinha diminuído. Contudo, o relatório da ERS afirma que «Em 2024 foram realizadas 17.807 IVG por opção da mulher nas 10 primeiras semanas de gestação, o que se traduz num aumento de 5,5% no número de procedimentos realizados face a 2023 e num aumento de 13,0% comparativamente a 2022». Só nos últimos três anos, foram interrompidas 50.449 gravidezes: 15.762 (2022), 16.880 (2023) e 17.807 (2024). Ou seja, foi negada a vida a mais de 50.000 nascituros.
Portugal apresenta índices de natalidade muito baixos, pondo em causa a renovação das gerações. Não se pode ficar calado, diante de tamanho acontecimento. Devido à liberalização total, sem motivo ou justificação médica ou criminal para realizar o aborto, contando apenas a vontade da mulher, assistimos a um ataque violento à dignidade da vida humana.
A vida humana é sagrada desde a sua conceção até à sua morte natural. A nossa constituição consagra no Artigo 24.º n.º 1 o Direito à vida afirmando que «A vida humana é inviolável.»
Não vamos andar em referendos, como em 1998 e 2008, cada qual com um resultado diferente e sem valor vinculativo porque nunca votaram mais de 50% dos eleitores. Cabe aos nossos órgãos de soberania regulamentar e defender a vida humana, não a sua eliminação, dando às mulheres e aos pais a capacidade de escolher, bem como as ajudas necessárias a prosseguir com a vida concebida com toda a coragem e felicidade.
Defendamos a cultura da vida, ousemos falar, pois se outros calam, gritemos nós: a vida humana é sagrada. E não esqueçamos que todos os que são a favor do aborto, são pessoas que nasceram, porque alguém as gerou e cuidou. Não neguemos esse direito a nascer, seja a quem for.
Sérgio Carvalho, Professor e Jornalista