Para a Racionalização das Políticas Públicas em Matéria de Desporto...

OPINIÃO
Por Gustavo Pires *

Se António Costa quer sair da cauda da Europa como afirma o semanário Sol, no que diz respeito ao desporto, deve começar por exigir ao Ministro da Educação (e desporto) a justificação política da participação portuguesa nos Jogos Olímpicos de Inverno Pequim (2022) a custas do erário público. E o Ministro da Educação deve exigir ao presidente do Comité Olímpico de Portugal (COP) que justifique e informe o País e o Governo sobre quanto é que custaram quatro anos de preparação olímpica e a ida a Pequim de três atletas, técnicos e dirigentes, para fazerem o quê, com que resultados previsíveis e com que vantagens para o desporto e o Movimento Olímpico nacional. E esta seria a primeira medida de higiene político-social para Portugal, em matéria de desporto, começar a sair da cauda da Europa. Quer dizer, controlar gastos perfeitamente absurdos que acontecem no desporto a fim de os aplicar onde fazem falta. E absurdos porquê?
Se António Costa quer sair da cauda da Europa, em matéria de desporto, deve assumir que a ida aos Jogos Olímpicos de Inverno à custa do dinheiro dos contribuintes é uma decisão que, no quadro da racionalização das políticas públicas em matéria de desporto, cai no domínio do incompreensível e inaceitável. Portugal não pratica nem desportos de neve nem desportos de gelo... não tem condições climáticas, não tem cultura, não tem infraestruturas naturais ou artificiais, não tem praticantes, não tem técnicos, não tem dirigentes. As vantagens para o país e os portugueses de se enviar uma Missão Olímpica aos Jogos Olímpicos de Inverno são as mesmas que conseguiria o Burkina Faso se também, enviasse atletas. Por isso, por mais voltas que se deem à nacional olímpica racionalidade, não se conseguem perceber as vantagens para Portugal, os portugueses e o desporto que decorrem da participação de três atletas nos Jogos de Inverno. Atletas que ninguém sabe quem são, de onde surgiram, qual o currículo e o que é que vão fazer a Pequim pelo que as palavras do presidente do COP quando diz não estar à espera de “resultados excecionais” (Público, 2022-02-05) só podem ser entendidas com um certo sentido de humor negro. 
Se António Costa quer sair da cauda da Europa, pois bem, deve começar por encontrar gente competente para tutelar um desporto que está há demasiados anos a funcionar em roda livre à custa do dinheiro dos contribuintes. É tempo do Governo, este ou qualquer outro, começar a cuidar da boa aplicação dos dinheiros públicos que é o primeiro passo para se tirar o desporto nacional do estado caótico em que se encontra. É necessário ir buscar gente que, por um lado, no respeito pelo livre associativismo e, por outro, pelas obrigações inalienáveis que competem ao Estado, seja capaz de dar uma direção e um sentido ético ao desporto nacional. Um desporto que, do ponto de vista ético, enquanto, todos os anos, descarta da prática desportiva institucional milhares de jovens ao atingirem 18 anos de idade, anda pelo mundo "à pesca" de atletas de alto rendimento a fim de, através de naturalizações “à lá minute” quando necessárias, representarem Portugal nas competições desportivas internacionais. O dramático da situação é que se caiu numa dinâmica de circular mediocridade: Como não existe um volume suficiente de jovens portugueses a praticar desporto, vão-se buscar atletas ao estrangeiro para representar Portugal nas competições internacionais, e como se vão buscar ao estrangeiro atletas para representar Portugal nas competições internacionais, os jovens portugueses desistem ou deixam de ter interesse em praticar desporto. Um desporto que, para além de apresentar as mais baixas taxas de prática desportiva da UE (27) em consequência de todos os anos, serem afastados mais de trezentos mil jovens (em 2018 números do IPDJ: 342,295), alguns dirigentes, completamente alienados das condições económicas, sociais e desportivas de um país falido e endividado, no limite do absurdo, defendem a construção de pavilhões de gelo a fim de se obterem resultados nos Jogos Olímpicos de Inverno!!! Como se os resultados desportivos se justificassem a si mesmo e fossem conseguidos só porque se constroem infraestruturas.
Se António Costa quer sair da cauda da Europa, o próximo Governo, mesmo antes de tomar qualquer medida estruturante, deve mandar fazer rigorosas sindicâncias aos principais organismos desportivos que recebem dinheiros públicos e a começar por aqueles que usufruem das maiores quantias. Querem mais dinheiro? Então, é necessário que o Governo comece a controlar cada cêntimo proveniente dos bolsos dos contribuintes. 
Se António Costa quer sair da cauda da Europa deve começar por aceitar que resultados desportivos conseguidos sem uma base de sustentação com um volume apropriado conduz a uma visão protofascista do desenvolvimento do desporto e à estupidificação das populações sobretudo das mais desfavorecidas. Por isso, tirar o desporto nacional do buraco ideológico em que se encontra é decidir se se quer seguir o exemplo da Dinamarca ou da Finlândia ou o exemplo da Bulgária ou Roménia. Porque, se o exemplo a seguir for o da Dinamarca ou Finlândia é obrigatório desencadear uma mudança de mentalidades e de paradigma. Uma mudança que facilite as reformas estruturais conducentes à construção de um sistema de desenvolvimento do desporto nacional fundamentalmente orgânico a partir do entusiasmo dos jovens, das famílias e das comunidades através das escolas e dos clubes de base local. Quer dizer, é necessário idealizar a partir da base do sistema desportivo um novo paradigma, em alternativa ao estuporado sistema atual insuportavelmente burocrático, olimpicamente centralizado num subserviente culto de personalidade em estruturas que se justificam a si mesmas à custa do dinheiro dos contribuintes.
Em conclusão, se António Costa quer, realmente, sair da cauda da Europa basta que o seu Governo maioritário, se deixe de olímpicos floreados que só conduzem ao desperdício de dinheiros públicos e ao subdesenvolvimento desportivo e, tendo em vista a racionalização das políticas públicas em matéria de desporto, na sua plenitude, cumpra o septuagésimo nono constitucional. Simplesmente.

 

*Professor jubilado da Faculdade de Motricidade Humana 

 

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